Em uma confortável e espaçosa sala de estar, dois homens discutem. Um deles é alto, forte, bonito. O outro, mais baixo, magrelo, narigudo; verdadeiro xerox de Woody Allen. Estão os dois em pé, parados. O mais alto se chama Ronaldo, graduado em Economia, CEO de multinacional do ramo de cosméticos. Adriano, o magrelo, é escritor e escreve muito mal. Portanto, ficou milionário. Sabe-se lá por que, caiu nas graças do público, escrevendo estórias esotéricas, minadas por mensagens de motivação e que terminam sempre com a mesma nota de rodapé: O MUNDO É SEU
Os dois são um casal. Os dois discutem. O motivo, a fixação de Adriano em Al Pacino. Ronaldo sente ciúmes. Claro, um ciúme justificadíssimo, afinal, quem não sentiria ciúmes diante de uma possibilidade tão real de traição, não é? Agora, Ronaldo cansou, sentou, cruzou as pernas, enquanto Adriano fica brincando com o bico de seu scarpin framboesa
.
O fenômeno toma fôlego e começa:
— Ai Adriano, você tá me ouvindo? Você nunca me ouve!
— Tô sim, more!
— Para com isso, sério. Tá ficando doentia essa fixação por ele…
— Amor, é só um ator. Mora nos EUA, não tem perigo nenhum! E olha, hoje em dia ele tá bem acabadinho, só gosto da fase oitentista dele, sem neuras.
— Sem neuras? Sério, só falta chover, de tão úmida que fica a sala quando ele aparece! Porra, Adriano! Ele é baixinho, narigudo, o que você vê nesse cara? O que ele tem que eu não tenho?
— Você é mil vezes melhor, mil vezes. Eu só acho ele interessante, gosto dos filmes dele, poxa. E PARA DE COÇAR O SACO NA MINHA FRENTE, MEU DEUS! TIRA ESSA MÃO DA CUECA, PORRA! Cadê o romantismo?
— Romantismo? Não me venha essa agora!
— É. Você nem disfarça mais a falta de educação. Nem a tampa da privada você abaixa!
— Mas pra quê? Desde quando você mija sentado?
— Desde sempre. Você que não repara em mim!
— Viu? Eu não tenho como competir com ele. Ele não é real. Não é um executivo, com um trabalho chato como eu… Mas quem te leva pra comer sushi? Quem assiste os filmes conceituais de veado com você? EU! EU!
— Como assim, filmes de veado? Agora você vai dizer que é machão?
— Veado é quem dá.
— AAAH, me diz que eu não escutei isso! QUE DECEPÇÃO! Você realmente pensa isso de mim? Eu sou um veado, sou sua mulherzinha, e você é o machão?
— É! Você não passa de um veadinho!
— VAI SE FODER! ISSO PASSOU DOS LIMITES! VOU TE QUEBRAR NO MEIO!
— Vem então, seu magrelo de merda!
Nota: Após partir para a agressão, Ronaldo quebrou três costelas de Adriano, além do nariz do companheiro. Adriano conseguiu dar duas mordidas na mão de Ronaldo, mas está tudo bem entre os dois. Eles se reconciliaram e planejam adotar uma criança em breve.
Motivado pela superação do trauma, Adriano escreveu mais um livro de sucesso, Quem come é gay também?. Atualmente o casal reside em Campinas, mas costuma passar férias em Pelotas, ou em Florianópolis, com dois amigos surfistas.
A história acima é real. Mas, não tem nenhuma lição. Aliás, tem sim:
O MUNDO É SEU