Thiago Verney

Equipe Laranja

Thiago Verney

Em 1989, enquanto o Muro de Berlim rachava ao meio, eu tentava vir ao mundo em uma Ilha paradisíaca. Não nasci nem à esquerda, nem à direita. Quando aprendi a escrever, desejava ser alguém na vida como qualquer outra pessoa. No entanto, aos 13 anos ganhei uma guitarra e, cinco anos mais tarde, escolhi jornalismo. Ainda quero fazer uma banda com Bruno Volpato, mas não comprarei o pedal de guitarra que ele está vendendo.

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Sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Bola de Ferro – o Início

Está na hora. Jefferson Sery levanta da cadeira de plástico, desce as escadas provisórias e vai em direção à mesa composta pelo diretor de curso, reitor e professores da faculdade. Todos olham para o jovem e uma música, escolhida meses antes da formatura, toca enquanto caminha pelo palco. Ao chegar perto das autoridades, estaciona levemente inclinado, e o reitor levanta algo parecido com um escovão para encerar carros perto de sua cabeça. Recebe o grau de publicitário. A plateia aplaude com veemência.

É a primeira conquista de Sery desde 1984, ano em que nasceu. O magrão de jeans e sapato sujo – conhecido como Jeff Gazela – retira a toga ao fim da cerimônia e salta mais alto que o próprio apelido. Para o pipoqueiro que trabalha no cinema ao lado da universidade, era uma simples segunda-feira de março sem muitos lucros. Para Gazela, um dia inesquecível.

Como se tivesse visto a família pela primeira vez ao sair do útero, abraça os pais e diz:

– Não vejo a hora de entrar no mercado de trabalho! Obrigado a vocês. – desabafa, emocionado. O desejo é compartilhado pelos colegas em volta.

A três quarteirões do lugar, um prédio de cinco andares comporta a RTY/HJ, maior agência de publicidade de Ribeirão Preto, no cruzamento entre a Brigadeiro Ynácio Brandão e Vila Madureira. Não por acaso, a festa de formatura é na cobertura do prédio, onde tem piscina e um ambiente espaçoso. A oportunidade só foi proporcionada aos formandos porque o tio do orador da turma é sócio-diretor da empresa. No dia seguinte, muitos já estariam contratados. Nada mal para novatos.

Oportunidade

Os convidados entravam aos poucos com chapéus de palha gigantes e chocalhos na mão. Assim como as garotas, de vestido rodado e maquiagem forte. A festa – por indicação do orador – era no estilo mexicano, pois o próprio ganhara três tequilas da agência para compartilhar entre os amigos formandos. No entanto, Gazela estava atrasado para a comemoração. Tinha que ainda buscar o amigo Teó – contração de Teófilo Urcati Brandão. Acabou ligando de novo para o parceiro, que demorara para atender:

– Porra, não tais pronto ainda? Precisas do que, uma tequila no rabo, bixo?

– Fala meu querido! Estou descendo. Chamei a Mônica. Ela vai levar as amigas.

– Melhorou. Em 10 segundos estou partindo. Black hawk desliga.

A dupla chegou na festa bem quando ocorria um pronunciamento. O tio do orador, sócio-diretor da RTY/HJ, subiu na mesa para cumprimentar os formandos. “Estou feliz de vê-los neste terraço com uma conquista na mão para entrar no mercado de trabalho. Por isso mesmo, gostaria que algum de vocês, como teste ao conteúdo que aprenderam nesses quatro anos de curso, bolasse uma frase para o nosso novo cliente: a marmoraria Gavetão”. Logicamente, os que ensaiaram risadas devido ao nome da empresa, já estavam descartados pelo diretor. Gazela pensou pouco, pediu o microfone e gritou de primeira:

– O slogan poderia ser: “Não seja cara-de-pau. Compre mármore Gavetão”.

O silêncio rasgou o zum-zum da festa. Quem chegou antes, descobriu que a marmoraria tinha como principais clientes as funerárias da cidade. Inclusive dois parentes do orador já tinham sido enterrados com mármore Gavetão.

Mas para a surpresa do publicitário, quando o amigo Teó já ia tirando o microfone, o diretor começou a bater palmas. Surpresos, todos imitaram o possível chefe com aplausos ao colega.

– O bom humor é imprescindível para o publicitário. Bem vindo ao clube! – fala o sócio-diretor, orgulhoso.

Ressaca, mas carteira-assinada

O telefone do Gazela toca às 11:45. A boca com gosto de cabo de guarda-chuva, o cheiro de tequila no sovaco, o lençol embaraçado no chão do quarto e uma amiga da Mônica no chuveiro. A noite tinha sido boa, mas lembrava de pouca coisa. “Acorda!”, alguém grita. O telefone continua tocando “Smoke on the water” na versão em xilofone. Gazela procura o botão de soneca, mas é uma ligação da RTY/HJ. Entra na caixa postal: “Sou eu, Jeff. Vamos conversar aqui no escritório hoje pela tarde. Temos muitas ideias para compartilhar”.

Em um pulo, Gazela novamente justifica o apelido e bota a calça, camisa amassada, deixando todos os vestígios da festa para trás. Provavelmente terá um emprego. Pegou um táxi e voou até ao famoso cruzamento. Na secretaria da agência, pediu para falar com Urtomani. Foi prontamente atendido. O próprio foi buscá-lo no térreo da empresa:

– Vamos à minha sala. Temos uma vaga para você.

Ansioso, Gazela lembra que esqueceu o currículo embaixo da cama.

Sem problemas. Urtomani já trouxe um contrato de experiência para o rapaz assinar.

– Então vou falar o que te interessa. Começas a trabalhar hoje pela tarde, salário de R$3.000, mais bonificações pelo serviço. No entanto, terás uma condição especial, que não é utilizada em nenhuma outra empresa e tem surtido um ótimo efeito aos trabalhadores.

– Que seria…?

– Para efeitos da gerência de pessoas do departamento de RH, não revelamos os métodos de trabalho desta condição especial. Mas tens o direito de não aceitar o emprego. Fica a seu critério escolher a vaga.

– Imagino que não seja nada que me tire do sério. Se tirar, fará bem para o meu bom humor. – e completa com risadas nervosas.

 

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