César Soto

Equipe Laranja

César Soto

Enquanto assistia Whale Wars num desses canais de bichos ou História ou coisa que o valha, César Soto decidiu que era hora de levantar as mangas e tomar parte no conflito entre ambientalistas e baleeiros. Assim, arrumou as malas, juntou suas escassas economias e passou a integrar a tripulação da pequena embarcação Sea Shepherd. Em duas semanas, honrou suas raízes e sabotou o motor do barco e envenenou a comida, se juntando assim aos japoneses. Malditos homens brancos e suas interferências em tradições milenares

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Segunda-feira, 6 de maio de 2013

Divisão de bens

Ele deixara o Rio de Janeiro. Formado e sem perspectiva de emprego, voltava para a casa da mãe para tentar alguma coisa sem precisar pagar aluguel. Ela ficara. Tinha mais dois anos até conseguir o diploma e, de qualquer forma, morava com os pais, então nunca teve pretensões de sair da cidade.

Cinco anos depois, se cruzaram na Paulista, ao acaso. Ambos iam ao trabalho, cada um em uma ponta da avenida.
– Oi… – cumprimentou ela, timidamente.
– E aí. – respondeu, seco.
– … – ela não sabia bem o que dizer.
– Que porra cê tá fazendo aqui?
Ela não respondeu.
– Sério. Você inventou aquela história de traição quando eu já estava aqui. Eu tentei falar contigo, tu não quis nem me ouvir. Eu respeitei. Agora me diz, que porra cê tá fazendo aqui?
– Tô trabalhando ali no Paraíso.
– Há quanto tempo?
– Comecei mês passado.
– Hum.
Ficaram ali. Cinco, dez, 15 minutos sem abrir a boca.
– Isso não vai dar certo. Eu evitei voltar ao Rio depois daquela briga. Só fui pra porra da colação de grau. Não queria correr o risco de te encontrar. E daí tu vem pra cá?
– Cara, a cidade é grande pra caralho.
– É, mas no teu primeiro mês aqui a gente já se encontrou. Meu trampo é na Consolação. Eu faço esse caminho todo dia. Puta que pariu.
– Tá. Eu mudo de caminho. Não preciso entrar nesse quarteirão. Pronto. Problema resolvido.
Mais alguns minutos desconfortáveis enquanto ele considerava a proposta.
– Ok, mas e a Augusta?
– Que que tem a Augusta?
– Eu vou lá todo fim de semana. Sei que você curte esses barzinhos. A gente vai acabar se encontrando na Augusta.
– Foda-se a Augusta. Enfia no cu, a Augusta! – retrucou ela, começando a perder a calma.
– E a vila?
– Que vila?
– Madalena.
– Porra, tô morando lá. Não vai dar pra evitar. Tu ficou com a Augusta, me deixa ficar pelo menos com o bairro onde eu morro, né, caralho.
– Merda. Eu falei que não ia dar certo. Mas tudo bem, a vila é tua. Acho melhor a gente já separar os outros bairros, só pra facilitar.

Foram dividindo a cidade. Bairro a bairro, com alguns poucos problemas – “Porra, eu também gosto de comida italiana e tu já ficou com os sushis da Liberdade. O Bexiga é meu, vai se foder” -. As linhas de metrô foram igualmente divididas. Ele ficou com a 1 e a 3. Ela, com a 2 e a 4.

Passaram então a separar os estados. Começaram pelo Sul e foram subindo, em direção àqueles que nenhum dos dois fazia exatamente questão de manter pra si. A questão era puramente de orgulho, mesmo sabendo que ninguém jamais iria ao Acre, ou Rondônia, ou até mesmo Pará.

O próximo passo foi lógico. Com o Brasil devidamente combinado, a escalada chegou ao mundo. Tentaram estabelecer um sistema por continentes, mas em pouco tempo a ordem se tornou caos, e era cada país por si. Inglaterra! França! Austrália! Pareciam duas crianças jogando War no meio da rua.

Até que restou apenas um. Se despediram e foram para seus trabalhos. Como manda a tradição, a Suíça ficou determinada como país neutro.

Nunca mais se viram.

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